Padge celebra volta aos palcos do Bullet For My Valentine

A história nos mostra que, sempre que uma banda já estabelecida lança um álbum autointitulado, o que ela quer transmitir é a ideia de recomeço. Michael Paget, ou Padge, guitarrista do Bullet For My Valentine, parece relutante em concordar, embora reconheça que “é definitivamente outra banda com Jason [Bowld, baterista] e Jamie [Mathias, baixista] agora.”

Já são 22 anos de estrada, com o diferencial que “os últimos dois [anos] foram um inferno para Matt [Tuck, vocalista e guitarrista] e para mim, mas eis aqui o nosso atestado de sobrevivência.”

O processo de composição de Bullet For My Valentine teve início lá em 2018, mas o lockdown imposto pelas autoridades britânicas no combate à pandemia da Covid-19 resultou em “mais tempo para se ligar no disco e nas músicas novas, sem contar que aprendemos a trabalhar em meio às regras e restrições. A pandemia definitivamente ajudou a moldar esse disco”, reconhece.

Tanto moldou que No Happy Ever After, uma das melhores do play, soa como uma crônica dos tempos pandêmicos. Padge não sabe se concorda ou não. “Na verdade, fiquei tão acostumado com os nomes que demos às músicas na etapa de pré-produção que não lembro qual é essa”, ri, levemente constrangido.

O Bullet For My Valentine figura entre as principais lideranças do estilo metalcore. Uma semelhança entre ele e o nü metal é justamente o hate gratuito do qual ambos são alvo. Para Padge, “isso é coisa de quem tem piru pequeno”. 

O guitarrista ainda afirma que “esse é o tipo de coisa que me deixava furioso no passado. Hoje em dia, só rio disso. Se um cara perde tempo propagando esse ódio, ele é um idiota, é um cuzão. Pessoas assim são ridículas”.

Lembro a ele que essa fala pode gerar repercussão, ao que responde: “Não estou nem aí, caiam dentro, não ligo, quem está perdendo tempo são vocês!” e quase rola de tanto rir.

Quando Matt e ele deram início à banda em 1998, o supracitado nü metal ainda estava em alta. Ouve-se um pouco dessa estética em My Reverie. Ao ser questionado se isso foi intencional, Padge desconversa: “É metal e ponto final.”

Uma das músicas mais famosas da banda é o mantra anti-bullying Waking the Demon lançado 13 anos atrás, que Matt compôs inspirado nas poucas e boas que sofreu na mão dos valentões de sua escola. Será que novo álbum tem alguma música de temática semelhante? Padge garante que sim para a maioria delas. “Quando coisas do seu passado ainda te incomodam e você escreve sobre elas, está meio que exorcizando seus demônios. É um processo contínuo. Chamo isso de medicina do metal”, explica.

Conto que na capa consigo enxergar tanto uma caveira quanto uma lâmpada. Ele interrompe: “Essa capa é engraçada, porque minha mãe, por exemplo, enxergou um cogumelo. Acho que isso vai variar de pessoa para pessoa. Eu, por exemplo, não consigo ver nada disso”, diz.

Mas, antes que eu pudesse argumentar algo como “mas é o disco da sua banda!”, ele complementa: “Dessa vez contamos com uma superequipe de arte. Eles ficaram responsáveis por essa parte, permitindo que Matt, eu e os outros pudéssemos nos ater na música. No passado, as capas ficavam sob nossa responsabilidade, mas somos músicos e não designers. Trazer essa equipe foi uma ótima sacada.”

Também conto que os solos de guitarra me lembraram muito o estilo de Randy Rhoads, com notável influência da música clássica e uma execução típica de quem ficou horas e horas estudando os fundamentos da Teoria Musical.

Padge confirma que isso se aplica a Matt — “grande fã de Zakk Wylde, que, por sua vez, é um grande fã de Randy Rhoads” —, mas não a ele: “Meu lance é mais Dimebag Darrell (Pantera), Kirk Hammett (Metallica) e até Slash (Guns N’Roses).”

A pergunta sobre o quanto esses três influenciaram as composições para o novo álbum resultou em nova desconversação: “As músicas do novo álbum apenas brotaram de mim”, resume.

Três meses atrás, o Bullet For My Valentine realizou seu primeiro show em anos. Mas a volta às turnês já tem data de início: em 31 de outubro, a banda começa um giro pelo Reino Unido.

“O álbum sai dia 23 [de outubro], e essa era a data mais próxima”, diz Padge quando pergunto se a escolha pela noite de Halloween foi intencional ou mera coincidência. Às nove e pouco da manhã, a veia marqueteira não devia estar pulsando tão forte no cara ainda…

Do novo álbum, ele garante que serão tocadas “três ou quatro [das dez] músicas”. Quando sugiro que Shatter, a faixa 8, daria uma baita música de abertura, ele concorda: “Essa certamente será uma das escolhidas!”

O Bullet For My Valentine veio ao Brasil em três ocasiões ― a última delas em 2019. Com o relógio prestes a dar o tempo de entrevista, peço a Padge que fale a respeito das lembranças que carrega daqui. A resposta deveria me surpreender, mas não.

“A comida, cara”, diz ele. “Os fãs eram incríveis, adorei conhecer os pontos turísticos, mas a comida… amei ir a todas aquelas churrascarias… e o vinho!”, ri como se tivesse bebido uma jarra.

Com o tempo prestes a acabar, peço que ele mande um recado para esses fãs que não são tão legais quanto uma boa picanha maturada: “Espero que todos fiquem bem em meio a essa loucura toda. Sentimos falta de vocês. O novo álbum está prestes a sair e eu espero que vocês gostem. Obrigado pelos anos de apoio e, se tudo der certo, não demorará até que nos encontremos novamente!”

(por Marcelo Vieira)

Fotos: Facebook / BulletForMyValentine