Review ao vivo: Dropkick Murphys, Madball e Cockney Rejects

 

Festival Barna’n’roll 2023
Bandas:  Dropkick Murphys, Me First and The Gimme Gimmes, Madball, Cockney Rejects, The Slackers, Good Riddance e Authority Zero
Local: Poble Espanyol, Barcelona, Espanha
Data: 28 e 29/07/2023

A expectativa estava nas alturas para o warm-up do Barna’n’roll. O festival tem por tradição realizar uma jornada antes e, às vezes, também após o final do grande evento. Se não for um warm-up, é uma post-party com bandas tão boas quanto as que figuram no cartaz oficial e em um local de capacidade reduzida.

Então, o fato de um evento desse porte ter colocado na tradicional sala Razzmatazz um pré-festival com Authority Zero, Good Riddance e Descendents foi um plus sem precedentes, a tal ponto que muitos consideravam que essa noite tinha mais qualidade do que a grande jornada de sábado.

Entretanto, por razões que muitos já conhecem, o vocalista do Descendents (Milo) sofreu um infarto em Barcelona, e a banda foi obrigada a cancelar a turnê europeia. Foi um verdadeiro balde de água fria para aqueles que se dizem punks, mas só colecionam as bandas com hits. Como resultado, houve uma enxurrada de críticas e pedidos de devolução de ingressos (somente para a sexta-feira).

É até estranho começar uma resenha com essa “introdução”, mas foi assim que o público sentiu. Restava-nos imaginar o que a organização faria: colocar um grupo substituto? Com certeza, essa possibilidade foi estudada, mas o tempo era curto, o que fez do Good Riddance o headliner do momento.

Era uma posição que a banda não ocupava há algum tempo dentro de turnês europeias ou festivais desse porte. E como estaria a sala? Vazia, meia-boca? Em muitas ocasiões, ler as redes sociais é o mesmo que ler bula de remédio. Um simples analgésico pode te deixar vegetando numa cama, segundo diz a bula, é claro. O efeito foi o mesmo; saímos de casa com a certeza de que iríamos encontrar um lugar vazio – e nos enganamos.

Se existe algo dentro do verdadeiro público punk rock é apoiar a cena, apoiar quem está ali para dar tudo de si, e foi assim que 80% do público (ou mais) se comportou em Barcelona. Coitado de quem não compareceu.

O Authority Zero, assim como o Good Riddance, teve mais tempo de palco do que inicialmente previsto e, assim que chegou ao backstage, ainda deu tempo de ver a banda adicionando músicas ao setlist, chegando ao número de 16 temas. Abriram com “12:34”, seguida de “No Regrets”, e todo o virtuosismo do baixista Mike Spero na introdução. Houve um momento de respiro mais para o meio da apresentação com o ska de “Big Bad World” e “Struggle”. O grande finale daquela que seria então a banda de abertura, com apenas meia hora de palco, ficou por conta de “When We Rule” e “Lift One Up”, com o vocalista Jason DeVore cantando junto ao público.

Felizes foram aqueles que fincaram o pé e compareceram à sala Razzmatazz para afogar as mágoas da ausência do Descendents. E foi justamente aquela porcentagem que pediu devolução do ingresso que proporcionou aos presentes o conforto de assistir ao show, dançar, pular e surfar sem concorrência por metro quadrado. Os californianos não imaginavam um público tão presente, dedicado e passional como o encontrado, e a noite de sexta-feira passou para a história.

O setlist facilmente poderia ter alcançado o número de duas dúzias de temas, com um público que cantou tudo e um grupo altamente motivado. “A Credit To His Gender” foi responsável por abrir o set, seguida de “Letters Home” e “Libertine”. Para quem conhece a banda, sabe que essas três músicas de abertura não deixam pedra sobre pedra, afinal, o Good Riddance não é um grupo de punk rock melódico tradicional, o quarteto fusiona muito bem com hardcore, e os riffs de guitarra dão o toque final.

“Half Measures”, de um de seus trabalhos mais recentes, foi muito bem recebida, assim como “Edmund Pettus Bridge”. Do disco mais celebrado da banda (“Operation Phoenix”), tivemos “Shadows Of Defeat” e “The Hardest Part”. Foram cerca de 90 minutos de apresentação, algo que para muitos dos presentes foi inédito, pois não puderam vivenciar o auge da banda no final dos anos 1990 e início dos anos 2000. Isso é o que chamamos na Espanha de “dar a volta na tortilha”. Conseguir reverter a situação está na genética do punk rock.

Sábado, 29/07/2023

Despertamos no sábado com a dúvida se o Madball estaria presente, como se a ausência de última hora do Descendents não fosse pouco. O baixista Hoya ficou em terra no aeroporto de Miami devido ao tradicional caos aeroportuário nos meses de verão na Europa e nos Estados Unidos.

A notícia positiva foi confirmada na página de outro festival quando foram divulgadas fotos da apresentação do quarteto na noite anterior. Mas quem foi o responsável por abrir a grande jornada foram os veteranos do The Slackers com seu ska rico em melodias e refrões, e nem mesmo o sol escaldante foi capaz de ofuscar. Um público ainda reduzido, porém bastante fiel, cantava e dançava no Poble Espanyol em canções como “Wasted Days”, “Married Girl” e “Old Dog”.

Quem também marcou presença e por sorte já sob sombra no palco foram os britânicos do Cockney Rejects. A presença do quarteto já era vista desde a chegada no recinto. Uma grande bandeira da Inglaterra com fotos e símbolos da banda e do West Ham United estava estendida em uma das laterais do palco e foi nesse clima que escutamos e desfrutamos de “Flares and Slippers”, “We Are The Firm”, “East End” e “Join The Rejects”, entre outros clássicos.

Stinky Turner continua em forma, cantando e boxeando ao mesmo tempo. O vocalista deixa pelo menos um par de quilos para trás a cada apresentação. O recinto já contava com um bom público. Colocar o Madball no meio do cartaz era provar para todo mundo que a mistura (dentro do estilo) é a essência do festival.

Muitos se anteciparam ao comentar que os nova-iorquinos seriam um peixe fora d’água, mas o carisma de Freddy e a energia desprendida da banda é contagiante, seja você fã do puro hardcore ou não. Outro fato que funciona com a banda é o idioma que Cricien domina muito bem. Falar o idioma local é um plus e conquista corações.

Abriram com “Hardcore Lives”, deixando claro a proposta e reivindicando o estilo. Seguiram com “Heavenhell” e atacaram de clássico com “Lockdown”. Por falar em clássico, “Set It Off” marcou território e mais adiante “Can’t Stop, Won’t Stop” deixou o público insano. As dúvidas com o baixista substituto foram dissipadas em questão de minutos – trata-se do atual baixista do Born From Pain, banda holandesa de hardcore. O Madball foi um verdadeiro rolo compressor no Barna’n’roll.

Depois de tanta fúria veio o momento de pura diversão com o Me First and The Gimme Gimmes, que como eles mesmos se definem, é a maior banda de covers do mundo. A diferença é que os integrantes são personalidades conhecidas do mundo punk rock, e as formações vão mudando com certa frequência. No baixo, pode ser o Fat Mike do NOFX ou Jay Bentley do Bad Religion, mas dessa vez ficou por conta do CJ Ramone – nada mal. As guitarras da vez ficaram a cargo de Speedo (John Reis), que é vocalista e líder do Rocket From the Crypt, e Joey Cape, vocalista do Lagwagon.

Uma sequência de covers obviamente transformados e tocados ao melhor punk rock de artistas como Black Sabbath (“Changes”), Gloria Gaynor (“I Will Survive”), ABBA (“Dancing Queen”), John Denver (“Take Me Home, Country Roads”) e Elton John (“Rocket Man”), entre outros. Divertidos? Até certo ponto sim, mas não sabemos se para todos.

Para fechar a noite, tivemos o Dropkick Murphys, que era uma das bandas alvo dos organizadores. Há algum tempo, eles vinham tentando colocá-los no Barna, em projeto que foi inicialmente adiado por conta da pandemia, mas que finalmente se realizou. O clima de festa teve seu ponto alto com o público cantando em massa “The State of Massachusetts” e “The Boys are Back”, com Ken Casey liderando a multitudinária banda, já que Al Barr segue afastado por problemas familiares.

Casey não se limitou a ficar no palco, como muitos pensavam, e desceu diversas vezes para cantar junto ao público, um presente ao mesmo e máximo respeito aos “irlandeses” de Boston. Incrível ver de perto todo o funcionamento da banda, a troca de instrumentos, a equipe de apoio e tudo que engloba um show deste porte.

“Paying My Way” expôs o lado emocional da banda e a comunhão com o já comentado público, e com “I’m Shipping Up to Boston”, o público foi literalmente à loucura. Ainda tivemos “Rose Tattoo” e “Worker’s Song”, temas que fazem jus a toda a história do DKM, que expõe suas feridas e para quem cantam e compõem. Conhecer as origens para compreender o presente.

Texto e Fotos: Ana Paula Soares e Mauricio Melo (Snap Live Shots)