Mark Mangold fala sobre as influências clássicas do Keys

Com uma vasta experiência na cena musical, Mark Mangold, conhecido por seu trabalho com bandas como Touch, American Tears e Drive, She Said, embarca em uma nova jornada criativa com o Keys. Ao lado do vocalista Jake E., Mangold explora um som que desafia rótulos, mesclando elementos de rock clássico, modernidade e uma ampla gama de estilos. Em entrevista exclusiva, o tecladista compartilha detalhes sobre o processo de composição, as influências que moldaram o novo álbum da banda e os desafios de trabalhar à distância.

O Keys se destaca por sua abordagem experimental e não convencional, o que torna difícil categorizá-los em um único gênero. Para Mangold, essa liberdade criativa é o que impulsiona o som da banda. Ele fala sobre como a colaboração com Jake E. contribuiu para um disco repleto de variações de humor e estilos, além de destacar as letras politicamente carregadas que permeiam algumas faixas. Nesta conversa, Mangold revela os bastidores da gravação e as expectativas para o futuro do Keys.

Rock Brigade: O Keys é descrito como tendo uma sonoridade única. Como vocês chegaram a esse resultado?

Mark Mangold: No Keys, eu só toco teclados, não toco guitarra. Então, eu exploro vários sons de teclado e tenho uma noção de como queremos que soe em nossas cabeças. Nós apenas seguimos esse caminho porque há muitos sons disponíveis agora para um tecladista, em sintetizadores e computadores. Muito disso é gerado dessa forma, e você não está confinado a um único estilo. Gostamos de experimentar.

Você poderia nos dar um exemplo de como essa experimentação se traduziu no som do álbum?

Sim, a questão da banda é que não nos limitamos a um único gênero, o que é uma faca de dois gumes. Isso torna um pouco difícil de comercializar, porque com todas essas gravadoras especializadas, elas fazem um tipo de música muito específico — death metal, heavy metal, rock melódico. Mas tentamos não nos limitar a nada disso e apenas ser criativos. Isso remonta à maneira como pensávamos nos anos 1970 e 1980, tentando ser criativos e criar um som novo e característico. Ainda mantemos essa mentalidade, ao invés de cair em um gênero e repetir um som que já foi feito milhares de vezes. Estamos definitivamente tentando alcançar algo que tenha um som próprio. 

Trabalhar com Jake E., que tem um alcance vocal incrível, te deu alguma liberdade criativa específica na composição?

Muita. Nós tentamos não nos limitar e realmente seguir onde a música nos leva. Quem imporia esses limites? As pessoas querem ouvir algo novo. As gravadoras, sim, querem que seja algo específico, mas nós não fazemos isso. Não fazemos prog de guitarra, nem prog de teclado que soa como Yes, ou death metal. Ignoramos tudo isso e buscamos nosso próprio público. 

“The Grand Seduction” parece ter uma pegada mais rock. Como você transita entre a composição de músicas mais pop e outras mais pesadas?

Você sabe, é como uma noite você estar com vontade de comer comida chinesa e na noite seguinte querer tacos. Depois, você quer comida francesa. É uma linguagem, e nós sabemos como falar essa linguagem. Então, por que limitar nossa maneira de comunicar? Realmente, tudo se resume a transferir emoção, e você faz isso da maneira que puder. Às vezes, acordo às 6 da manhã com uma melodia na cabeça e vou tentar gravá-la. Não sei de onde vem, vem de algum lugar do universo. Quem sou eu para dizer “não vou fazer isso”? Então, apenas seguimos em frente, como em “Shining Sails”, que apenas surgiu e fizemos o melhor que podíamos, sem nos preocupar com a categoria em que se encaixava. 

O press-release menciona que “The Grand Seduction” foi divertido de gravar. O que tornou a gravação tão agradável?

Bem, é um trabalho árduo. Também é difícil fazer à distância, porque Jake está na Suécia e eu estou onde quer que esteja, Nova York, às vezes Suécia, às vezes Flórida. Acordo às 5 da manhã e é uma da tarde para ele. Cantamos músicas pelo Zoom, à distância. Eu estou lá, ouvindo o melhor que posso, e vamos seguindo assim. Mas é divertido porque é criativo e você está se expressando. Ele é um ótimo cantor e é muito bom trabalhar nesse nível alto de talento. Então, sim, foi muito agradável.

“Vortex” é uma música que mistura a modernidade de Jake E. com o seu classic rock refinado. Você pode nos falar um pouco mais sobre a influência de cada um na composição da música?

Bem, eu comecei querendo escrever uma música no estilo do Jake, e basicamente criei a música e muitas das melodias. Na minha mente, eu estava canalizando o Jake a partir do que ouvi dele. Então, ele adicionou o toque dele, e acabou se tornando uma mistura disso. 

Baseado no single “Vortex”, o que os fãs podem esperar do restante do álbum?

Bem, acho que é uma experiência momento a momento. Estamos tentando criar momentos e proporcionar uma experiência ao ouvir do começo ao fim, algo que te leve a algum lugar. As letras são, para mim, uma parte muito importante do álbum. Não sei quantas pessoas realmente mergulham nas letras, mas espero que no LP e no CD possam lê-las. É um álbum às vezes muito raivoso, político, antiautoritário, criticando os controles que vivemos e a porcaria que temos que enfrentar diariamente, perpetrada por muitas pessoas poderosas e impiedosas que não se importam com a vida humana. Há muito disso nas letras. Mas o diferencial deste álbum é que, às vezes, é um pouco formulaico, como “Vortex” com verso-refrão, verso-refrão, blá blá blá. Mas geralmente chegamos a um ponto e nos perguntamos para onde queremos ir a partir daí. Pode ter sons de elefante, pode ter cordas, podemos mudar o tempo. Em “All I Need”, mudamos o tempo e fizemos um solo de bateria. Realmente depende do nosso humor e de onde queremos ir, tudo vindo do instinto e da criatividade. Esperamos que o ouvinte esteja conosco na jornada. 

Você tocou com diversas bandas ao longo da carreira, incluindo Touch, American Tears e Drive, She Said. De que forma cada uma dessas experiências moldou seu estilo como músico e compositor?

Trabalhar com Al [Fritsch (1963-2017)] no Drive, She Said foi incrível, com um vocalista tão incrível e voz potente. Ele tocava todos os instrumentos muito bem, então realmente conseguimos fazer nosso metal melódico ou o que quer que fosse. Sempre tínhamos uma ótima voz nas músicas, e isso foi uma forma divertida de explorar a melodia mais antemática que podíamos criar. Tentávamos escrever muitos hinos pesados e cativantes. Com o Touch, foi diferente, com uma voz diferente, surgindo em uma época diferente, anos antes do Drive, She Said. Mas você trabalha com os elementos que tem e faz o melhor que pode com aqueles músicos. Celine Dion pode cantar “Parabéns Pra Você” e você saberia que era ela. Acho que o mesmo vale para Touch e Drive, She Said. A banda tinha um som, e não importa o que tocássemos, soava como Touch e como Drive, She Said. Acho que o mesmo acontece com o Keys, especialmente com a voz do Jake. Vai soar como o Keys. 

“Fools Game” foi um grande sucesso nos anos 1980. Como foi a experiência de colaborar com Michael Bolton?

Foi maravilhoso, somos bons amigos. Foi uma época em que Nova York era um lugar muito criativo, saíam muitas coisas ótimas de lá. Havia clubes onde você podia ir, como o China Club, um lugar chamado Nirvana, onde podia encontrar pessoas e no dia seguinte ter uma sessão de composição. Foi assim que conheci Michael, Aldo Nova, Benny Mardones. Era um ambiente muito criativo, uma época maravilhosa para estar em Nova York. Estávamos famintos, sem dinheiro, e queríamos muito fazer algo, então trabalhamos duro e esculpimos um som lá também. Claro, Michael tinha seu próprio som. 

Seja pela repercussão ou pela experiência em si, qual você diria que foi a colaboração mais marcante na sua carreira?

Você está falando sobre dinheiro agora? 

Pode ser.

Bem, se é sobre dinheiro, uma música que escrevi com Michael chamada “I Found Someone” [gravada pela cantora Cher em 1987] foi muito importante porque me permitiu continuar na indústria da música, ao invés de ter que fazer outra coisa. Isso me deu muita liberdade por muito tempo. Mas eu diria que amei tudo o que fiz. É muito divertido quando você está com uma pessoa criativa e rola uma química. É isso que vivemos, realmente. Pode acontecer de novo amanhã, aconteceu na semana passada quando escrevi uma nova música com Jake. É o processo criativo, e isso é realmente quem somos. Toda vez que você trabalha com alguém que compartilha esse talento, é como jogar pingue-pongue. A outra pessoa preenche o vazio. Eu posso escrever músicas sozinho, mas me canso de mim mesmo. Quero estar com outra pessoa que tenha uma outra perspectiva. É divertido e muitos pensam assim também, querem colaborar. 

Vários artistas gravaram suas composições. Qual a sensação de ter seu trabalho interpretado por cantoras icônicas, como Cher, Jordin Sparks e Laura Branigan?

Eu tive sorte. Muita sorte. Acho que muitas das minhas músicas merecem estar nesse nível também, acho que escrevi outras músicas que Cher poderia ter gravado, mas não aconteceu. Há muita sorte envolvida. Ano passado, aconteceu algo estranho. Um artista de hip-hop, Kid Culture, que escreve com Justin Bieber, escreveu “Yummy”, que foi um grande sucesso, me procurou para colaborar. Escrevemos uma música de hip-hop com minha música e a voz dele, que é como Drake ou Travis Scott, muito legal, chamada “Persistence of Memory”. Foi muito divertido e ótimo sair da minha zona de conforto. Escrevi k-pop, j-pop. Novamente, é outra linguagem, e você tenta fazer isso com as melhores pessoas que fazem isso. Assim, você está no caminho certo. 

Você trabalhou com produtores suecos recentemente. O que acha da cena musical na Suécia e como ela se compara à sua experiência nos Estados Unidos?

Bem, a Suécia reúne um grupo incrível de talentos. Desde Abba, Roxette, até os dias atuais, parece que tem um som pop e rock cativante. Estou me envolvendo em alguns projetos suecos agora e sei que se uma pessoa sueca está envolvida, vai soar ótimo e tem algo que adoro. Além disso, posso trabalhar com a língua inglesa, então me sinto bem por isso também. Eles têm uma mente muito aberta. Eles querem sucesso comercial e são muito conscientes disso. É muito legal. 

Com uma carreira tão extensa, qual o maior aprendizado que tirou da música?

Acho que é manter o otimismo e nunca desistir. Sempre dar o seu máximo. Você entra em algo e percebe que precisa ir além para fazer acontecer. E você simplesmente faz, não desiste, e tenta fazer o melhor possível. Tem que soar incrível. A competição é acirrada, os vocais têm que soar bem, as guitarras têm que soar bem, a bateria tem que ser matadora. Você precisa proporcionar uma experiência incrível para o ouvinte. Então, acho que é essa atitude mental que me mantém firme. 

Olhando para o futuro, quais são seus objetivos como músico? Ainda tem algum sonho que gostaria de realizar na indústria da música?

Claro, quero continuar espalhando minha música cada vez mais. Espero que as pessoas apreciem o álbum do Keys. Quero continuar fazendo isso. 

O que podemos esperar do Keys daqui para frente? Existem planos para turnês ou lançamento de novos materiais?

Bem, o Touch vai tocar na Inglaterra no dia 12 de outubro, no Firefest. Temos ensaiado para isso, vai ser muito divertido. Em relação ao Keys, gostaríamos de tocar ao vivo, mas é uma situação muito cara colocar o Keys no palco. São três tecladistas com vários teclados, o que demanda muito dinheiro. Estamos tentando resolver isso. Não somos uma banda de guitarra com baixo, bateria e guitarra que pode subir no palco em cinco minutos e tocar um set. O Keys precisa ser a atração principal, ter uma equipe de som e fazer tudo direitinho porque há muita coisa acontecendo.

Por Marcelo Vieira