Confira como foi o primeiro fim de semana do Hellfest, na França

Parte 1
Dias: 17, 18 & 19/06/2022
Local: Clisson (França)
Texto: Ana Paula Soares
Fotos: Mauricio Melo (Snap Live Shots)

Crescer, evoluir, acertar e errar para tentar outra vez.  Assim podemos iniciar nossa resenha do décimo quinto aniversário de um dos maiores e melhores festivais do mundo, o Hellfest.  Avaliando é claro, desde nossa primeira participação em 2010 até os dias atuais, numa época que até  poderíamos utilizar aquela piada “quando cheguei aqui, tudo isso era mato”.   E era mato mesmo!  O festival se situava do outro lado da rua da que hoje é o recinto, o camping existia aonde atualmente é o evento, o chão era de pedra e terra e passávamos o festival comendo poeira em dias de sol e atolados na lama em dias de chuva. Porém, há doze anos atrás se comparamos com outros festivais que até então havíamos presenciado, já era a Disney do metal, punk, hardcore. Já havia uma preocupação com a decoração e o entretenimento do publico em torno do mundo apocalíptico.  É claro que se compararmos aos dias atuais aquele Hellfest era brincadeira de criança.

O evento cresceu, investiu em detalhes, desde a entrada com portões em forma de amplificadores, o ponto de informação é um pedal de guitarra estilo Boss DS-1, além da tradicional guitarra gigante.  Grades com imagens de esqueletos forjados a ferro, uma nova estatua do Lemmy na praça de alimentação do War Zone, um corredor com uma exposição de guitarras comemorativas de cada edição.  Todos esses detalhes entram pelos olhos e agradam, enriquecem o prazer de estar no festival.   Com relação às novas infraestruturas o que mais nos chamou atenção foi a pavimentação diante dos palcos Altar e Temple, dois dos três que ainda são dentro de lonas e que se tornava um local sufocante devido a poeira e a baixa circulação de ar nos mesmos.  Somente o Valley continua ao formato antigo, com um gramado que só dura um dia e logo se torna incômodo para publico, banda e trabalhadores.  Também, muitas das “ruas” do evento foram cimentadas.  Diante dos palcos MainStage 01 e 02 e o palco War Zone foram cimentados e decorados com o símbolo do Hellfest e a escrita “Circle Pit” e o restante continua gramado. Alem de tudo isso há um novo sistema de transporte.  Já não se chega de carro, van, ônibus ou casas rodantes ao festival, igualmente está proibido estacionar em qualquer rua num raio de quilômetros do mesmo. Só se chega nos ônibus lançadeira oferecido pelos organizadores de maneira gratuita.  Todos os veículos ficam num estacionamento gigante (gratuito mediante a apresentação do ingresso) e de lá, com as ruas vazias pela proibição mencionada acima, levados em transporte para o Hellfest, um sistema novo que possivelmente estará apresentando pequenos contratempos mas que como tudo no evento, será melhorado em breve.

Dia 1

Então vamos ao que interessa.  As opções são muitas desde o primeiro minuto mas devido ao calor de 41 graus, completamente atípico para a época e local, reduzimos nossas atividades e escolhemos a dedo nossos artistas, alguns nem tão favoritos assim mas eram os mais convenientes. Tudo isso para chegar menos derrotado ao final do primeiro fim de semana já que continuamos na cidade de Clisson até o segundo fim de semana.

Nosso primeiro pitstop foi com os americanos do Slapshot no palco War Zone.  Havíamos cruzado com a banda em Barcelona uma semana antes e assim como naquela ocasião, os de Boston não decepcionaram com um set recheado de clássicos como “Old Times Hardcore” e “I’ve Had Enough”.  E no mesmo palco ficamos para Rudeboy, vocalista do  Urban Dance Squad, daquela geração dos anos 90 que misturou estilos entre rap, rock, punk, hardcore.  E a demonstração disso foi “Good Grief!”, “Fast Lane” e “No Kid”.  Já no palco principal o showman Frank Carter & The Rattlesnakes agitou o público.  Caminhou sobre cabeças alheias e ainda plantou bananeira em “Sticky”, participou de um circle pit massivo em “Tyrant Lizard King”.  Na sequencia, enquanto The Offspring cantava hits no MainStage 01 e o Rotting Christ demolia o palco The Temple, os holandeses do No Turning Back tocavam sob o escaldante sol no War Zone.  Segundo palavras do próprio vocalista, em vinte e cinco anos de banda este foi o show mais quente de suas vidas e nós não duvidamos disso.

Em mais uma coincidência de horários, o High On Fire dividiu o publico com Mastodon e nós nos decantamos pelo segundo nome em questão. Mastodon é atualmente uma das maiores e mais completas bandas do mundo. Abriram com “Pain With an Anchor” do trabalho mais recente seguido de “Crystal Skull” e “Megalodon”.  E de volta ao anos 90, conferimos o Dog Eat Dog e seu groove com “Who’s the King” e “No Fronts” e se existe uma coisa que não perdem é de como levar entretenimento ao publico.  Tentamos assistir ao fenômeno Baroness em mais uma de suas visitas ao festival mas foi impossível entrar no Valley, acreditamos que da próxima vez estarão no palco principal ou o colapso continuará.  E entre o Deftones, sua lista de exigências e um mar de gente por atravessar  e o Cro-Mags, fomos na segunda opção por ser mais cômodo, rápido e feio como o icônico Harley Flanagan e um show que também não queríamos perder.

Nas doze badaladas “noturnicas”, Electric Wizard e Death To All disputavam terreno mas quem roubou a cena mais uma vez foi o Suicidal Tendencies.  Havíamos feito alguns shows da turnê em conjunto com o Bad Religion na Espanha há algumas semanas, lá também deram uma demonstração do que são capazes mas nada se compara ao visto no Hellfest.  Mike Muir não só desceu do palco como também, ainda na metade do show, convidou o publico para subir no palco até não caber mais ninguém e com “War Inside My Head” se iniciou a loucura com outros clássicos como “Possessed To Skate”, “How I Will Laugh Tomorrow”, “Pledge Your Allegiance” e “Subliminal”.  Mike Muir foi todo um gentleman em ajudar aos fãs descerem do palco junto aos seguranças e ao finalizar fez questão de cumprimentar um por um.  Nota dez para a postura e atitude de um cara que está há quarenta anos na quebrada.

Dia 2

Abrimos o segundo dia com os franceses do Lion’s Law já no War Zone num dia em que a temperatura bateu recordes.  Menos mal para eles que ao meio dia e quinze a sombra é vasta nesse palco.  A mesma sorte não teve o Agnostic Front.  Ícones do hardcore mundial, Miret e Stigma já quase sexagenários suportaram com classe o sufocante calor e despejaram toda sua fúria como “The Eliminator”, “Piece”, “Crucified” e “My Life My Way”, faltaram grandes clássicos mas nada que não podemos superar.  Nos palcos principais desfilavam nomes como Rival Sons, Steel Panther e Megadeth e seu incontestável show.  Mustaine levou uma emocionante ovação ao final da apresentação, foi bonito de se ver.

O Toy Dolls levou alegria e diversão ao publico.  Na sequencia ainda tentamos conferir o Sepultura, chegamos antes do previsto mas a lona do Altar já estava abarrotada.  Decantamos para um clássico maior e vimos o Deep Purple demonstrar que ainda merecem o espaço que lhes é oferecido.  “Highway Star” e “Pictures of Home” abriram a tarde e já em reta final “Smoke on the Water”, o clássico que não pode faltar.

Já semi-derrotados pela jornada, escutamos a certa distancia o Ghost entrar em cena enquanto esperávamos o Social Distortion em sua primeira visita ao Hellfest, e sabe-se la quando voltarão por estas bandas. “Road Zombie” foi a escolhida para abrir o set que teve um Mike Ness com a cara coberta por uma bandana.  Já com sua identidade secreta revelada executaram “Bad Luck” seguida de “Far Away”.  Outros clássicos como “Don’t Drag Me Down” e “Sick Boys” também figuraram no setlist.  Um show que foi aguardadíssimo pela velha guarda que sempre frequenta o festival.

Finalizamos nosso segundo dia com o enérgico  show do Anti-Flag, desta vez com a formação completa com a volta do baterista Pat Thetic que passou um bom tempo afastado das atividades, pelo menos nas visitas à Europa.  Junto com o set da banda também chegaram as primeiras gotas de chuva e uma drástica mudança de temperatura.  Sendo assim, ao som de “The Press Corpse” e “Broken Bonés” voltamos a reconhecer Clisson no mês de Junho, frio e chuvoso.  Já era hora.

Dia 3

Se existe uma coisa que sempre nos chamou a atenção no Hellfest é o fato de que toda mistura de som é sempre bem vinda e achamos que é daí que vem a admiração de todos, incluindo as bandas.  Colocar Moscow Death Brigade para tocar num festival de metal é, para muitos, um risco, uma incógnita.  Um hardcore / rap eletrônico mas com letras acidas e anti-Putin.  Todos os anos existe a votação de melhores shows do festival e temos a certeza de que o MDB estará entre os dez primeiros.  Também na briga pelo pódio ou pelo menos por marcar pontos para o campeonato estará o Red Fang que tocou no Valley no inicio da tarde e uma vez mais vimos a lona abarrotada.  Um show marcante desde o inicio com “Blood Like Cream” até o final com “Prehistoric Dog”.

Deez Nuts marcou sua habitual presença no evento, os japoneses do Maximum The Hormone deram seu particular show num dos palcos principais mas quem chamou a atenção no fim de tarde foi o Down que veio com sua formação quase original e justamente por estarem com tal formação o setlist foi recheado de clássicos como “Losing All”, “Lifer”, “Eyes of the South” e “Stone The Crow”.  A pausa entre os integrantes para se dedicarem à suas bandas principais foi crucial na hora de dar a volta por cima.  Korn também passou por ali e deixou uma lista de exigências para os fotógrafos mas quem deu aula de boa relação com o grêmio das imagens foi o Judas Priest que não exigiu contratos absurdos e nem exagerou na hora de limitar a quantidade de fotógrafos.  Atualmente é o show a ser visto já que a lista de clássicos sempre está ali com “Painkiller” ou “Breaking The Law” mas desta vez a banda investiu pesado no visual de palco que somente grandes nomes podem se dar o luxo e as imagens falam por si só.

O Gojira também participou da festa diante de seu publico e jogando em casa e o Sick Of It All fez no War Zone um show à altura de seus quase quarenta anos de estrada levando o hardcore aos quatro cantos do planeta com os incansáveis irmãos Koller.

Em outros anos este parágrafo estava dedicado às despedidas e agradecimento mas aqui estamos, descansando e turistando em algum lugar da França à espera dos quatro dias restantes de evento.

Até.